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quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Buceta Onde crescerm as rosas silvestres ( Conto de Anderson)


Onde crescem as rosas silvestres*
“From the first day I saw her I knew she was the oneAs she stared in my eyes and smiledFor her lips were the colour of the rosesThat grew down the river, all bloody and wild”

( Nick Cave, Where the wild roses grow )

Ele a conquistou desde a primeira vez que se olharam e ela soube disso naquele mesmo instante, sabia que era seu destino seguir com ele pra onde quer que fosse. Tinha certeza do mesmo modo como tinha certeza que o amava.
Ele trajava preto, como sempre, e segurava uma rosa vermelha e cheia de espinhos com a qual lhe presenteou. Disse que os espinhos é o que importava nas rosas e não a sua beleza ou perfume. Aquilo a deixara perturbada ao mesmo que lhe encantara. Era um rapaz magro, 21 anos, de olhar triste e voz suave. Não se demorou, foi embora tão de repente como quando chegara, mas já a havia conquistado.
Naquele dia a rosa foi posta em um vaso com água. Lentamente ela murchou, perdeu o brilho, a maciez. Ao amanhecer ela estava morta. Mas a garota se considerava viva como nunca antes esteve, radiante. Ao se preparar pra sair, escolheu a melhor roupa (preta), colocou o perfume mais cheiroso e passou o batom mais vermelho. Pálida que era, linda ficou.
Chegou na faculdade mais cedo que de costume, algumas pessoas lhe olharam estranhas, outras fizeram observações de como estava linda. Ela gostou, mas se vestira assim para ele, nada adiantaria se ele não gostasse. Assistiu às primeiras aulas sem conseguir se concentrar. Pensava apenas na rosa, murcha, lá no vaso, murcha, jamais esquecida.
Durante o intervalo de uma das aulas foi que ele apareceu. Estava na praça do campus, sentado, sozinho como sempre. Fumando e lendo um livro surrado. Hesitante ela se aproximou, sentou ao seu lado. Nada falou, apenas ficou lá, esperando, sabia que cedo ou tarde ele lhe dirigiria a palavra. Ela esperou pacientemente. Ele continuou sua leitura e depois de um tempo fechou o livro e olhou para ela.
– Você é a rosa silvestre, linda e fúnebre. Cheirosa como uma, bela como uma. Eu sou o jardineiro que cultivará tal flor, jamais deixarei sua beleza murchar.
Seus dedos finos acariciaram-lhe a face. Ela sentiu o toque de sua mão gelada e soube o que aconteceria em seguida. Fechou os olhos, ele aproximou seus lábios e a beijou com ternura. Um beijo suave em sua boca carnuda. Naquele momento ela decidiu que se morresse agora, morreria feliz. Toda a felicidade de uma vida se concentrara naquele beijo. Ele parou de beijá-la e disse:
– Eu quero te cultivar em meu jardim, Elisa. Apenas ele é digno de você.
Então se levantou e saiu. Ela ficou estática por alguns minutos, ele sabia seu nome! Ele lhe beijara. Ele queria cultivá-la em seu jardim. Uma lágrima escorreu por um de seus olhos, borrando a maquiagem que fizera com tanto capricho. Decidiu ali que daria o mundo por ele, mataria por ele.
Morreria por ele.

Os dias passaram e eles foram se tornando cada vez mais próximos. Passaram a sair juntos e conversavam bastante, Elisa descobriu que ele pintava quadros belíssimos e morava sozinho. Havia saído de casa por ter brigado com os pais e vivia da venda de seus quadros. Ele lhe apresentou a maconha e a cocaína. Ela deixou de assistir as aulas de seu curso, descobriu que aprendia muito mais com ele. Aprendia sobre a vida, novos pontos de vista. Passaram a caminhar nos finais de tarde no bosque que circundava a cidade, próximo ao lago onde ficavam por horas atirando pedrinhas e conversando trivialidades, ou fumando um baseado. Foi lá que eles transaram pela primeira vez, ela virgem se deixou guiar pela experiência do rapaz. Sangrou, mas ela nunca se arrependeria. Nunca. Ele a fez prometer que lhe entregaria todas as suas desgraças e Elisa prometeu sem ter muita idéia do que ele queria dizer com isso.
Em casa também sua vida mudou, mal trocava algumas palavras com seus pais, ela se tornara quase invisível para eles. Por vezes dormia fora, com ele. Descobriu que ele tinha medo do escuro, que chorava durante a noite e tinha muitos pesadelos nas poucas vezes em que conseguia dormir.

Por três meses eles se amaram loucamente. Num dia cinza de Novembro, ela não o encontrou em casa. Correu para o lago.
Lá estava ele, fumando e relendo pela milésima vez seu livro de Rimbaud. Ela o observou de longe por alguns segundos e então se aproximou. Sentou ao seu lado. Estava frio. Logo iria chover.
– Minha rosa silvestre – ele falou com suavidade – Você sabe onde as rosas silvestres crescem tão docemente escarlates e livres?
Ela não respondeu. Ele continuou.
– Se eu lhe mostrar as rosas você seguirá?
Elisa continuou em silêncio e então assentiu com a cabeça.
–Sim, seguirei as rosas, seguirei você, até onde me levarem. Irei até o fim. Beberei até o último gole, de vinho, ou de veneno.
Ele se levantou e sorriu.
– Venha comigo – falou.
Ele a guiou por entre as árvores e a levou até a margem de um rio pedregoso que se escondia por ali e onde cresciam as mais belas rosas que ela já vira. Ele a beijou e começou a despi-la. Deitaram por sobre os cascalhos e fizeram amor como nunca haviam feito antes. Ele a fez gozar várias vezes. Disse que a amava pela primeira vez.
Foi então que ela viu a enorme pedra que ele segurava.
– Toda beleza deve morrer – disse ele.
Ela fechou os olhos. Sentiu a pancada da pedra lhe esmagando a cabeça repetidas vezes. O sangue jorrando em torrentes e se misturando ao cascalho. O barulho dos ossos quebrando. Ele a esmagou com força, bateu até que a pedra quebrou.
Então viu que ela estava morta. Ali já não havia mais vida, nem beleza. Ele começou a chorar, abraçou o corpo inerme contra o peito e a beijou por várias vezes.
– Eu te amo – Disse.

A chuva começou a cair com força. Lavando o sangue, banhando as rosas. Ele apanhou uma rosa e plantou entre os dentes quebrados de Elisa. Depois colocou o seu corpo no rio corrente. E chorou, chorou e chorou.
Nessa noite ele pintou um belíssimo quadro: Um jardim de rosas silvestres ao lado de um rio.

Roberto Denser, 16/10/06



*Conto livremente inspirado em Where the wild roses grow, de Nick Cave.












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